O recurso à constituição de uma sociedade comercial administrada e em nome de uma terceira pessoa tem originado falências com responsabilização dos atuais corpos gerentes no plano criminal por dissipação de património. Não obstante, fora destas situações patológicas cumpre referir que existem casos sociedade transmitir certos bens para uma outra, ou para constituição de uma outra sociedade sem qualquer obstáculo no plano ético.
A operação que acima nos referimos é aquilo que é intitulado de cisão simples, cujo regime se encontra consagrado nos artigos 118.º a 123.º do Código das Sociedades Comerciais, a cisão trata-se de uma operação pela qual a sociedade primitiva (cindida) destaca parte do seu património no sentido de criar uma outra sociedade.
Porém, existe clivagem doutrinária no que concerne a esta possibilidade, que se encontra intimamente ligada a interpretações legislativas.
Assim, a doutrina subdivide-se em duas teorias ligadas à interpretação do artigo 122.º do CSC: as restritivas e as não restritivas.
A teoria não restritiva, da qual não somos defensores, afirma que não existe qualquer distinção entre o que se encontra disposto no número 1 e número 2 do 122.º do CSC, defendendo-se que a sociedade que transmita parte do seu património para uma nova sociedade é responsável solidariamente com a nova sociedade (a sociedade beneficiária).
Porém, em conformidade com a teoria de que somos defensores, caso a sociedade originária subsista à operação da cisão apenas esta é responsável pelas dívidas, não existindo responsabilidade da nova sociedade.
Porém, no que concerne às dividas da sociedade cindida deve ter-se em linha de conta o artigo 122.º do Código das Sociedades Comerciais:
‘’1 – A sociedade cindida responde solidariamente pelas dívidas que, por força da cisão, tenham sido atribuídas à sociedade incorporante ou à nova sociedade.
2 – As sociedades beneficiárias das entradas resultantes da cisão respondem solidariamente, até ao valor dessas entradas, pelas dívidas da sociedade cindida anteriores à inscrição da cisão no registo comercial; pode, todavia, convencionar-se que a responsabilidade é meramente conjunta.
3 – A sociedade que, por motivo de solidariedade prescrita nos números anteriores, pague dívidas que não lhe hajam sido atribuídas tem direito de regresso contra a devedora principal.’’
Sendo certo que o regime consagrado no número 1 do artigo 122.º do CSC regula os casos de cisão simples nos quais a sociedade cindida sobreviva à operação em causa.
Ora, através de uma interpretação restritiva/literal, é nosso entendimento que se encontra consagrado no disposto normativo acima indicado ambos os regimes para situações distintas, sendo que caso não tivesse sido esse o intento do legislador não teria pressuposto no número dois do artigo 122.º CSC que a sociedade cindida não seria responsável pelas suas próprias dívidas.
Foto por JOSHUA COLEMAN em Unsplash
Deixe uma resposta